Justiça – ruptura<br>ou continuidade?
Os assuntos da Justiça continuam na ordem do dia, em torno da reabertura de tribunais ou da falta de funcionários judiciais e magistrados, do elevado valor das custas ou da lentidão da Justiça.
Os problemas da Justiça vêm de há muito, e têm-se agravado, fruto das políticas levadas a cabo ao longo de 40 anos, com um marcado conteúdo de classe, por sucessivos governos e políticas de direita, do PS, PSD e CDS/PP, que degradaram e deixaram degradar as condições de realização da Justiça e a imagem que dela têm os cidadãos do nosso País. Olhando para os quatro anos da governação PSD/CDS, o balanço é por demais desastroso, agravando a insatisfação dos trabalhadores e do povo, que não consegue aceder aos tribunais para defender os seus direitos, e o sentimento de que a Justiça é impotente perante os grandes interesses económicos e financeiros.
No novo quadro político reconhecem-se medidas e sinais positivos, que vão desde a maior distensão entre a tutela e os profissionais, às correcções ao mapa judiciário, passando pelo pagamento das dívidas aos advogados pelas defesas oficiosas ou pela normalização dos cursos de recrutamento de magistrados. São pequenos passos, ainda muito insuficientes, quando os confrontamos com a imensidão dos problemas e situações, que perduram, como a falta de investimento para fazer face a carências de toda a ordem, a crónica falta de oficiais de Justiça e de magistrados ou a precariedade de meios humanos e materiais na investigação criminal, ou ainda a falta de resposta às disfunções e condições indignas que permanecem no dia a dia do sistema prisional.
O mapa judiciário, aprovado pelo anterior governo, com a forte oposição do PCP, conduziu ao encerramento, desactivação e desqualificação de inúmeros tribunais, afastando do acesso à justiça as populações de grande parte do território nacional.
A alteração do mapa judiciário e as medidas agora tomadas, com a decisiva contribuição do PCP, vêm corrigir os aspectos mais gravosos da lei anterior, repondo a realização de julgamentos em 47 municípios do País, devendo ser acompanhadas dos necessários meios que garantam o funcionamento eficiente desses tribunais.
A substituição de oficiais de justiça por funcionários de autarquias, mesmo que em número limitado e ainda que apresentada como medida (supostamente) temporária, merece a nossa clara discordância, por se tratar de uma decisão desajustada e que não dignifica a função judicial.
Este aspecto, do direito de acesso dos cidadãos à justiça e aos tribunais, para defesa dos seus direitos e interesses, em condições de igualdade, está muito longe de ser uma realidade. E se a nossa Constituição expressamente prevê e afirma esse direito, «(...) não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos», então estamos perante um clamoroso incumprimento, por omissão, da Lei Fundamental, uma vez que, todos sabemos, a esmagadora maioria da população não dispõe de meios económicos para aceder aos tribunais.
As custas judiciais atingiram valores escandalosos, incomportáveis para a bolsa dos portugueses. O apoio judiciário, também é sabido, não é digno desse nome, já que, praticamente, se aplica apenas em situações de indigência.
Pilar do regime democrático
Por proposta do PCP, aprovada no Orçamento do Estado para 2017, foi travado o aumento das custas judiciais. Graças ao PCP, em 2017 não há lugar à actualização das custas processuais, de forma a melhorar a acessibilidade dos cidadãos à justiça.
Continuam por responder problemas de fundo nesta área da soberania nacional.
No radar das políticas de justiça são visíveis as linhas de continuidade das políticas de governos anteriores, mas não se divisam sinais consistentes de ruptura, que há muito se exigem. Ruptura e inversão do processo de degradação do aparelho judiciário, dotando os tribunais do Estado dos meios necessários para cumprirem a sua função. Ruptura e reversão do processo de desjudicialização e privatização da administração da justiça, com a proibição do recurso à arbitragem nos litígios que envolvam o Estado e a limitação dos meios alternativos de resolução de conflitos. Ruptura para uma viragem consistente no combate ao crime económico e à corrupção, com uma política de efectiva dotação de meios para a investigação criminal, com o reforço do Ministério Público e a revalorização da Polícia Judiciária e com o aperfeiçoamento do quadro legal existente, no sentido de uma real criminalização do enriquecimento injustificado e do combate sem equívocos aos offshore. Ruptura e combate a quaisquer tentativas de interferência do poder político no poder judicial, com escrupuloso respeito pela separação dos poderes, garantindo mais, e não menos, independência dos juízes e mais, e não menos, autonomia do Ministério Público.
Como é seu dever o PCP, com a sua luta e iniciativa, continuará firme na defesa de um poder judicial independente, pilar fundamental do regime democrático.